no silêncio pegajoso que só o calor pode propiciar
à procura de um canto para dormir
vasculhou armários e gavetas, os livros e as roupas
e os papéis não deixavam espaço
suas garras firmaram-se na tela retrátil do notebook,
a qual achou volátil, mais quente ainda
sem abrir o bicotentou a luminária, quente demais
de debaixo da cama o mau hálito de um monstro
o enxotou - tá ocupado, amigo -
quase depenado, desistiu logo do ventilador
o vai e vem da maçaneta o esmagaria dentro
de pouco
o barulho no violão pareceu insuportável
chegou a cogitar a fresta entre a cama e a parede
e preferiu, foi ficando, sem palavras;
não se sabe o que irritou, o calor extra dos lençóis talvez
o fato é que o flagrei outro dia com as patas no meu rosto
tentando habitar minha boca
nidificar na minha voz
Um comentário:
O silêncio de Duchamp é mais incompreendido que superestimado. Duchamp fala pelos vazios, como numa anti-linguagem artística...
O nada é só o disfarce do ser perante o fenômeno, é o modo dele se manifestar de modo esclarecedor.
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