quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Me pediram para me auto-biografar e não consegui.



A tomada da consciência do dever poético foi simultânea ao encontro com a palavra. Ela ali diante de mim e ao esbarrar eu soube de uma vez, o dever do poeta não é para consigo ou para com outros ou para com os sentimentos do mundo; é um trabalho de edificação dos escombros de si mesmo e de sua realidade por meio do contato com as palavras, sendo estas não apenas a luva por meio da qual toco o que  me circunda e circunda outros e sim a silhueta mesma das coisas. Há um compromisso implícito em cada poema, desde o primeiro canto da Ilíada, desvendar a proporção entre tudo e nada, entre um pássaro e um poste, um motor e uma ninfa, um deserto em coma e um rio de súplicas através do sistema taxonômico da língua, que, mesmo adquirida, é anterior à experiência, às formas, ao pulso, aos suspiros, às oscilações e aos gestos - o poeta é o material da palavra.
O divã e a escada são muros a ser demolidos com a caneta e os dedos trêmulos.

Nenhum comentário: