Para a Júlia e os bêbados com quem ela esbarra.
estivador nunca esteve no mar
ele só tem como parar e olhar
quando está livre de cargas
aspira ao sal dos espaços abertos
por estar confinado a obrigações
prendem a terra seu passo
hesitante em largar os fardos
e morrer afogado
se atirando à vida que tanto quer
só espreita o que passa diante dele
ignorado suportando um mundo que
se não tomar para si ninguém quererá
aspira o sol da vida dos outros
iluminar um trabalho
mais só que os outros que, sós, admiram de longe
o estivador no porto das palavras
recebe e carrega o que todo o resto enviou
frustra enviar nunca,
por ninguém querer ler o que carrega
o que transformou com as mãos
outros esmagam com os pés
pisam sem querer quando passeiam por ali
o porto é um jardim impróprio de flores resignadas
por onde ninguém devia passear
e o estivador fica ali
ameaçador
recolhido à insignificância particular
ao valor íntimo de todos os escombros que vieram
encalhar em seus braços-caneta
seus escritos
carga apócrifa
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