quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Para a Júlia e os bêbados com quem ela esbarra.

estivador nunca esteve no mar
ele só tem como parar e olhar
quando está livre de cargas

aspira ao sal dos espaços abertos
por estar confinado a obrigações
prendem a terra seu passo
hesitante em largar os fardos
e morrer afogado
se atirando à vida que tanto quer

só espreita o que passa diante dele
ignorado suportando um mundo que
se não tomar para si ninguém quererá

aspira o sol da vida dos outros
iluminar um trabalho
mais só que os outros que, sós, admiram de longe

o estivador no porto das palavras
recebe e carrega o que todo o resto enviou
frustra enviar nunca,
por ninguém querer ler o que carrega

o que transformou com as mãos
outros esmagam com os pés
pisam sem querer quando passeiam por ali

o porto é um jardim impróprio de flores resignadas
por onde ninguém devia passear
e o estivador fica ali

ameaçador

recolhido à insignificância particular
ao valor íntimo de todos os escombros que vieram
encalhar em seus braços-caneta

seus escritos
carga apócrifa

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