sexta-feira, 19 de março de 2010

Ritmos do pulso nas artérias dos edifícios da cidade




para Júlia V. e Hannah Arendt


silêncio bolha
silêncio contato

eu sozinho sou dois
eu sem mim nem isso nem cercas farpadas


isolar dos escombros do meu olhar
cabisbaixo num espelho

eu comigo
conspiro contra minhas máscaras

eu sem mim na multidão sou um

eu na minha companhia
não preciso olhar nos olhos do que não quero
mas devo ver o que me faz fugir

eu entre pessoas atravesso a rua na corda bamba
não é fácil
só segurar a mão de quem não conheço

eu me reflito
à minha imagem e semelhança

não projeto (não mais)
linhas em rostos que não o meu

compulsões em gestos alheios
a calçada em convulsão
[vendendo berrando eletrocutando faíscas de ferragens retorcidas manchadas de sangue] 
meus dentes caem por descuido

desaprender a sorrir
rir por dentro basta

uma em mil gotas de colírio
nos olhos cegos da cidade
um em mil casos de delírio


monólogo coletivo em um anfiteatro vazio

dead end roads placas ordenam não vá fora de si não derrape



chuva num para-brisas
repelindo

relendo a caligrafia torta
da água em meus óculos

Um comentário:

Plas disse...

Acho que foi um dos poemas mais claros para mim aqui. Muito bom.