quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Desarrazoado

Acontece que não sei mais amar
Cartola

Samba triste que eu nunca fiz
Baden Powell
No balcão deste bar
Quis escrever um samba que não saiu
Ele sequer está cá dentro
Só não saiu mesmo
Sem rimas e sem repetir partes alternando
Um samba quase meio torto
Sobre o tema de sempre
O tema dos meus cigarros e
Da conversa
evento habitual nestas paragens
O tema das ilusões
Que descrevem nada
Nem mesmo o inalcançável
Das paisagens que trazes
Da fumaça que trago
Das derrotas que trato nenhum apaga
Da cerveja que desce menos amarga
Hoje que em outros dias escancarando
Ao som de pancadas neste balcão
O vazio de onde vem outro amargor
Mais doído e melodioso
Das ruas mais vazias dos pássaros censurados
das cigarras no cio enterrando garras nos meus tímpanos
Dos olhos injetados deste garçom que serve
Sabendo que todos sentem o que
Acredito ser muito mais exclusivamente meu agora, mas que nunca
Foi ao menos nosso
E saio tomando a calçada de assalto
Vago, gastando sapato e tristeza
Cansado de música instrumental
E cansado de palavras, das minhas
Apoiado em fazedoras do trottoir
E em pedestres-pedintes
(será que eles entendem o que digo?)
Por que
Me levas, portanto, a
Um impasse numa encruzilhada e me perguntas
Toca pra onde?
Estático olho o fundo dos olhos deles antes de mandá-los
Ao inferno, as perguntas falharam
Ao apagar dos postes
E ao acender dos apitos do vigia
Respostas foram menos bem-sucedidas
E se saíram pior porque se fizeram
Mais urgentes atropelando precipitando
O que aconteceria mais naturalmente de outra forma
E se espero que
O trôpego de sempre me pare pedindo fumo
Para ele não há mágoa represada
É tudo simples ali com a franqueza prometida um dia
Me deixar abater (melhor?) ao fim do dia
como as folhas de aço
Que fecham as portas do samba
Que eu quis fazer, mas nem isso consegui
Nesse dia que quer saber de mim e me depara
Com o que não quero ver
Sem medo e sem vergonha uma pena me invade
Pelo que fiz e não me arrependo
Mas deixa um rastro sangrento
Deixei de receber notícias deste mundo que me completa
Quando me afasto a pé pensando
Se não fora melhor não me enfiar por estes caminhos
Como se houvesse volta
Deste samba que me largou aqui

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